A polêmica decisão do presidente do Senado, Renan
Calheiros, de transferir para a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da
Casa a responsabilidade de decidir sobre a ampliação das investigações da
Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Petrobrás proposta pelo PT, é uma
manobra claramente procrastinatória destinada, com o incentivo do Palácio do
Planalto, a diluir o impacto do escândalo da Refinaria de Pasadena, que, graças
às trapalhadas de Dilma Rousseff, acabou criando riscos para o projeto petista
de perpetuação no poder. Trata-se de mais uma chicana política dentre as muitas
do amplo repertório de que o notório presidente do Senado se vale para levar
vantagem em barganhas com o Executivo.
Há nesse episódio, porém, algo muito mais grave do que a
cumplicidade de Renan Calheiros com o Palácio do Planalto para transformar em
pizza as investigações parlamentares sobre a Petrobrás. É a constatação de que
o presidente da Câmara Alta não hesita, por um lado, em desmoralizar o
instituto da CPI, poderoso instrumento de que os congressistas - em especial a
minoria - dispõem para cumprir com eficiência sua missão constitucional de
fiscalizar o Poder Executivo. E, por outro lado, Renan submete mais uma vez a
Casa a que preside ao vexatório exercício de se prostrar diante do Executivo.
Existe ainda nessa tramoia uma terceira e mais grave
ameaça às instituições democráticas. Se de acordo com a esdrúxula interpretação
de Renan Calheiros de que uma CPI sirva para tudo, menos para investigar a
fundo assuntos que incomodam um governo que disponha de base parlamentar
majoritária, está aberto o caminho para que seja vedado à minoria o direito -
mais do que isso, a obrigação constitucional - de controlar os eventuais
excessos da maioria e dos outros Poderes. Um direito e uma obrigação, aliás,
que são garantidos à minoria pela Carta Magna quando estabelece que uma CPI
pode ser convocada por apenas um terço dos senadores ou deputados federais, em
suas Casas ou no Congresso Nacional. Há também no texto constitucional, bem como
na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF), outras salvaguardas a esse
direito da minoria.
Coadjuvantes da farsa, parlamentares governistas tentam,
com argumentos falaciosos, criar confusão em torno do objetivo da CPI da
Petrobrás, que, de acordo com a lei, deve ser a investigação de "fato
determinado". No caso, a controvertida compra da Refinaria de Pasadena, no
Texas. "Já que vamos investigar a Petrobrás, por que não investigar também
outros casos suspeitos?", pergunta o senador petista Humberto Costa (PE).
"Desejamos apenas ampliar o debate", tergiversa Gleisi Hoffmann
(PT-PR).
Ora, se o PT quer exercer o legítimo direito de
investigar as denúncias de corrupção no Metrô ou eventuais irregularidades no
porto pernambucano de Suape, dispõe de maioria mais do que suficiente no Senado
e na Câmara para criar uma CPI para cada um desses "fatos
determinados". Quem é que poderia se opor a isso? Mas transformar a
investigação sobre a Petrobrás num "combo" é um deboche que só pode desmoralizar
o Congresso.
Além da proposta de CPI da Petrobrás apresentada pela
oposição no Senado, à qual o PT adicionou a possibilidade de ampliar a
investigação para abranger os casos de São Paulo e Pernambuco, e que nessa
condição será avaliada pela CCJ a pedido de Calheiros, há ainda mais duas
propostas, apresentadas na Câmara, uma pelos governistas e outra pela oposição,
de formação de comissões mistas de senadores e deputados, dedicadas também à
Petrobrás.
Em resumo: já que o escândalo que paira sobre a maior
empresa brasileira não sai das manchetes, armam-se esquemas ardilosos para dar
à opinião pública a impressão de que a base governista desenvolve corajoso
combate à corrupção, estando, no entanto, tudo armado para que qualquer CPI que
venha a se instalar para investigar a Petrobrás termine em pizza. E o pior é
que esse atentado à integridade institucional do Parlamento não está sendo
perpetrado pelo Executivo - que apenas o inspira. Sujam suas mãos membros do
Poder cujas prerrogativas democráticas deveriam proteger.
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